domingo, 18 de maio de 2014

Projeto Pensamento e Vida - Capítulo 2 - Vontade





No grande escritório da mente

A mente humana, segundo Emmanuel, é como um grande escritório, dividido em várias repartições; há o departamento do desejo, da inteligência, da memória e tantos outros.

Acima de todos eles, gerenciando-os de maneira esclarecida e vigilante, encontra-se o departamento da Vontade.

E o ponto alto da vontade, sua “auréola luminosa”, é a Razão.

“O instinto não raciocina; a razão permite a escolha e dá ao homem o livre arbítrio”, explica o Livro dos Espíritos.

E Kardec arremata, ponderando que “nos seres que têm a consciência e a percepção das coisas exteriores, ele [instinto] se alia à inteligência, quer dizer, à vontade e à liberdade” (L.E., Questão 75).

Desse modo, a vontade orientada pela razão, e não pelo instinto, nos afasta da animalidade e nos aproxima da angelitude.

Mas qual a relação entre vontade e cérebro, a que nos referimos ao término do artigo anterior?


Motor e leme

Em Pensamento e Vida, vê-se que o cérebro funciona como um dínamo, um motor que produz energias mentais, enquanto a vontade é o leme que dá direção a essas energias, o “botão poderoso que decide o movimento ou a inércia da máquina”.

Tais energias são, a saber, a Eletricidade, energia dinâmica; o Magnetismo, energia estática; e o Pensamento, força eletromagnética.

Afirma o benfeitor que “pensamento, eletricidade e magnetismo conjugam-se em todas as manifestações da vida universal, criando gravitação e afinidade, assimilação e desassimilação, nos campos múltiplos da forma que servem à romagem do espírito para as metas supremas, traças pelo Plano divino”.

O pensamento enquanto força eletromagnética surge, portanto, como um dos agentes diretamente responsáveis pela própria formação do universo.


Além da fronteira

Aqui, abro parênteses.

A eletricidade e o magnetismo são amplamente estudados há tempos pela ciência, e suas propriedades são relativamente bem conhecidas desde o Séc. XIX. O trabalho de físicos como Michael Faraday e James Clerk Maxwell é de extrema relevância nessa área.

Faraday, cujos experimentos levaram às invenções do motor e do gerador elétricos, percebeu a indissociável ligação entre o magnetismo, a eletricidade e — veja só  a luz.

Já Maxwell demonstrou matematicamente que a luz corresponde à propagação de ondas elétricas e magnéticas, e que, a depender do referencial, uma força pode tornar-se a outra e vice-versa.

Apesar de a correlação entre eletricidade, magnetismo e luz ser pacificamente reconhecida pelo meio acadêmico, o pensamento como força eletromagnética criadora do cosmos é uma ideia que ainda se encontra além das fronteiras do conhecimento científico e das cogitações filosóficas do nosso tempo, mesmo decorridos mais de cinquenta anos da publicação de Pensamento e Vida.

Por mais que as ciências quânticas atestem que, em alguns níveis da realidade, a mera interferência mental do observador seja capaz de modificar o objeto observado, essa informação sobre o pensamento fornecida por Emmanuel é, em última análise, para os encarnados do início do Séc. XXI, um artigo de fé.

Em todo caso, considerando a autoridade da fonte, tomaremos daqui por diante essa noção a respeito do pensamento como verdadeira, não a título de dogma intocável, mas como um fato que espera por ser oficialmente reconhecido também no plano físico, no momento oportuno.

Apesar disso, a sensibilidade dos artistas vem percebendo historicamente essa realidade, a exemplo do poeta alemão Friedrich Schiller, que ainda no Séc. XVIII afirmou que “o universo é um pensamento de Deus”.

Retomemos.


Quem pensa, afinal?

Quanto à relação entre vontade e cérebro, é preciso ter em conta que o cérebro, em si, não “pensa” — quem pensa é o espírito. Assim dispõe a doutrina espírita.

Em outros termos, conforme ensina André Luiz, o cérebro é "o órgão de manifestação da atividade espiritual, o instrumento que traduz a mente" (No Mundo Maior, cap. 3).

A vontade é, dessa forma, responsável por movimentar as energias mentais produzidas pelo cérebro, as quais variam de intensidade de acordo com a capacidade de reflexão de cada um.

Essa perspectiva, ao contrário da noção de pensamento dada por Emmanuel, já faz parte dos interesses filosóficos e científicos atuais.

A chamada “filosofia da mente”, criada na segunda metade do Séc. XX, se debruça sobre o tema, tentando compreender questões relativas sobretudo à consciência e à relação entre mente e corpo.

O desenvolvimento dessa área tem sido bastante acentuado, com importantes repercussões no campo da neurofisiologia, da psicologia cognitiva e da inteligência artificial.

Dito isso, percebe-se a razão pela qual o benfeitor se refere à vontade como "o impacto determinante”.

Sua importância é tamanha que, quando utilizada de maneira pouco esclarecida e invigilante, ela acaba por desorganizar todos aqueles “departamentos” da mente, desde a inteligência até a memória, passando pelo desejo.

O resultado desse desarranjo é a manutenção do espírito nos ciclos reencarnatórios inferiores e o consequente adiamento de sua evolução, até que tenha reparado todos os enganos cometidos em nome de sua vontade mal conduzida.

“Amém vos digo que de modo nenhum sairás dali até que restituas o último quadrante”, ensina Jesus (Mt, 5:26).


Limitações da vontade

A infinita sabedoria da Providência Divina, contudo, impôs limitações à vontade.

Nos dizeres de Emmanuel, “ela [vontade] não pode impedir a reflexão mental, quando se trate da conexão entre os semelhantes, porque a sintonia constitui lei inderrogável, mas pode impor o jugo da disciplina sobre os elementos que administra, de modo a mantê-los coesos na corrente do bem”.

Aqui o benfeitor reforça que estamos inevitavelmente sujeitos àqueles princípios de interdependência e repercussão: tudo se influencia mutuamente, o tempo todo, em todas as camadas da Criação.

Assim, cabe a cada um cuidar daquilo que está sob seu comando, no sentido de não condicionar a própria vontade à vontade eventualmente mal dirigida do outro.

Ao disciplinar sua vontade, o homem consegue manter-se ligado, sempre que quiser, a bons sentimentos, a uma emotividade que gere reflexos positivos no espelho da vida.

E Emmanuel é categórico ao afirmar que “só a vontade é suficientemente forte para sustentar a harmonia do espírito”.

Neste universo de interconexões em que a existência se desfralda, não basta exercer autoridade sobre a própria vontade para que a evolução do espírito se consolide: é necessário sobretudo desenvolver o Amor e a Sabedoria.

"Espíritas! amai-vos, eis o primeiro ensinamento; instruí-vos, eis o segundo", é a preciosa lição do Espírito de Verdade no Evangelho Segundo o Espiritismo (Cap. 6).

Mas quais aspectos da vida devem ser trabalhados, em parceria com as energias movimentadas pela vontade, para que se consiga esse objetivo? É justamente sobre isso que conversaremos de agora em diante no Projeto Pensamento e Vida.

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